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Ser criança

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Coisa mais linda do mundo é você ver uma criança feliz, saudável e brincando. Uma criança saudável é assim, rir, cai e levanta, às vezes um choro, mas principalmente adora se comunicar. Já repararam que alguns são meio tímidos nos primeiros contatos, mas logo se percebe que quer aproximação? Pois é! Criança é o ser mais amável, dócil e carente de amor.

A carência ainda é maior quando esta criança sofre algum problema. Um domingo desses fui com minha família almoçar na casa de um amigo. Ainda não conhecia a família dele, sabia apenas que tinha dois filhos, uma menina e um bebê. Neste dia foi que conheci a Aninha*. Aos quatro anos de idade, sapeca, peralta. Um detalhe me chamou a atenção logo que a vi, ela anda nas pontas dos pés. Lembrei do filho de amigo. Mas mesmo assim imaginei ser mania da menina.
Tentei uma aproximação com a Aninha*, mas logo uma pessoa comentou: “Quer levar a Aninha* pra tua casa? Aposto que você não agüenta uma hora com ela”. No contato ela pouco me deu atenção, tentei outras vezes falar com ela, mas nenhum sucesso, ela mal me olhava! Então um comentário da mãe: “A Aninha* vive assim mesmo, só se comunica quando quer, parece que vive no mundo dela”. Mais uma vez estranhei o comportamento da menina, apesar da minha pouca experiência com criança, convivo com o filho do meu noivo e nesta fase ele era bastante comunicativo.
Tentei outro contato, desta vez consegui fazer com que ela olhasse para mim, então perguntei algo pra ela, aquele olha vazio e a resposta dela pesou na língua enrolada. Foi então que me passou um fio de pensamento e no mesmo instante lembrei-me de uma reportagem que fiz tempos atrás na AMA – Associação de Amigos do Autista. Mesmo não sendo especialista – e estou longe disto, enxerguei muito dos traços de uma criança autista na Aninha*.
Aos poucos fui adquirindo a confiança dela e o contato entre nós duas ficou mais próximo. Consegui arrancar um olhar direto pra mim. Não sei descrever aquilo que senti quando ela olhou pra mim tentando falar algo que não saía de seus lábios. Procurei palavras e encontrei uma forma de tocar no assunto com a mãe dela, que contou que algumas pessoas já haviam comentado sobre o assunto, mas ela não acreditava que a filha teria algum problema. A menina nunca foi a uma consulta médica, mesmo percebendo os sinais no comportamento da criança, os pais nunca a levaram para qualquer especialista.
Ao final da conversa, a mãe, em um estresse perceptível na voz, comentou que a filha não tinha problema algum, que ela não fala porque ainda não tá na hora dela e em sua família há pessoas que pouco fala. Percebi que, caso a Aninha* tenha realmente autismo, a mãe custa a aceitar, não toquei mais no assunto. No entanto a Aninha* ficou na minha cabeça e pelo pouco que entendo sobre o assunto, sei a Aninha* precisa de acompanhamento especializado. O que me deixou triste foi perceber que ainda existe preconceito quanto a esta síndrome, por existir o preconceito, existe o medo de sofrer o preconceito. A sociedade ainda é muito cruel, apesar de já está mudando atitudes para conceitos como este.
Ainda brinquei um pouco com a Aninha*, brinquei o pouco que ela permitiu. Quando fui embora tentei despedir-me, acenei para ela diversas vezes, mas parecia que para ela não existia ninguém ali. Não contente fui tentar abraçá-la e ela mais uma vez me olhou, aqueles olhos...que ainda não me esqueci.
*Aninha: Nome fictício dado à personagem

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